2009 é um ano que vai se destacar na mente dos ávidos cinéfilos, admiradores da sétima arte: o ano mal começou e já sofremos o bombardeio de diversas produções memoráveis – e outras nem tanto – por conta da febre do Oscar e das promessas dos blockbuster, como foi o caso de Quem quer ser um Milionário?, Watchmen – e percebam que nem estamos falando de Wolverine, Transformers 2 e Gi Joe, que estão por chegar.
Nessa dinâmica surpreendente, inusitada e muito divertida, escolhi três recentes filmes para compartilhar com vocês e abordar um suposto ponto em comum que pode representar uma nova tendência comportamental, embutida nas mensagens cinematográficas. Sejam bem-vindos a mais uma viagem pelo universo das idéias da indústria cultural.
1) The Spirit – O Filme: a adaptação do herói da DC não tem a magnitude de Batman – O Cavaleiro das Trevas, mas The Spirit foi uma produção mal compreendida: ao ser enquadrado na categoria de adaptação de quadrinhos, os expectadores aguardavam um filme 100%e ação, efeitos especiais de tirar o fôlego e uma temática super heróica no sentido mais bruto e puro da expressão.
Porém, a proposta do filme dirigido por Frank Miller foi oferecer uma diversão descontraída, sem grandes pressões no estilo bem versus mal geralmente oferece. E tanta descontração forçou um caráter tão sexista que representou um tiro no próprio pé: ao sustentar-se na presença das beldades como Scarlett Johansson e Eva Mendes, o personagem The Spirit é tão mulherengo que mais parece um pegador na balada que propriamente um defensor da justiça e da cidade – Central City – que ele jura defender e amar. O herói vivido por Gabriel Macht é um protótipo do garanhão que se interessa por todas as mulheres – e só. E o que mais me incomodou: a necessidade da trama em reforçar a aceitação das mulheres em relação ao comportamento machista.
Bem, machismo à parte, The Spirit é entretenimento despretensioso, leve e eleva a vibe de quem o assiste. Se você estiver disposto a conferir a adaptação sem grandes expectativas e sem o senso de fidelidade ao que é um filme de HQ, pode se surpreender de forma positiva.
2) Milk – A Voz da Igualdade: realçado na mídia pelas indicações ao Oscar – e vitória de Sean Penn como melhor ator – o filme sobre o ativista gay que chegou a um cargo público nos Estados Unidos a despeito de toda repressão e obstáculos sociais, foca o momento em que os 40 anos de Harvey Milk trouxeram uma nova perspectiva ao personagem: ele foi o pilar e vítima da afirmação de liberdade sexual que tanto acreditava e defendia.
E, após a tragédia derradeira e anunciada, o filme torna-se um manifesto sobre a esperança individualizada, esperança que eu, você e a torcida do Corinthians precisamos alimentar indiferente de opção sexual, raça ou posição social. A mensagem conclusiva da produção merece e justifica o fato de ser imperdível se você busca arte com A maiúscula.
3) Ele não está tão a fim de você: baseado em um livro de auto-ajuda, a comédia água com açúcar diverte e transporta algumas situações reais que as mulheres passam nas tentativas de relacionamentos afetivos para as telas, de forma cômica e, em alguns casos, quase verídica. Tudo é abordado com leveza, mas dá umas dicas bem legais para que as ladies percebam se o homem amado está correspondendo aos seus encantos ou não.
Não é uma mega comédia, mas ensina que a melhor forma de encarar uma decepção amorosa é aceitá-la, de forma crua e tocando a bola em frente. E a personagem Gigi, interpretada por Ginnifer Goodwin, faz um discurso sobre a esperança mesmo quando a expressão dos sentimentos é vista de forma humilhante e vexatória que a comédia abre espaço para uma reflexão de como enxergamos nossos desencontros afetivos. E é muito legal perceber que os relacionamentos retratados passam a funcionar quando as pessoas abrem mão das ilusões e optam por encarar a realidade como ela é. É cool e parece uma versão cinematográfica de revistas focadas no público feminino, como Gloss, Capricho e Nova.
Além de ser três filmes que eu sugiro a vocês assistirem, vejo neles um forte denominador comum: a auto-afirmação individual. Cada um a sua forma, (o machista) The Spirit, o (manifesto de liberdade minoritária) Milk e (a percepção sentimental feminina) Ele não está a fim de você são produções que reforçam a identidade particular de cada um de nós e os motivos que fazem com que essas identidades sejam justificadas e desenvolvidas. Em um momento em que todos nós parecemos amontoados em uma única massa movida pela tecnologia, a retomada pela individualidade soa bastante interessante.
É como se voltássemos a ser movidos pelos objetivos internos, algo que parece ter sido sufocado com tanta modernidade e velocidade de informação. Um brinde à nossa individualidade. E a possibilidade de lidar com ela, independente de sua natureza.