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Legion: Uma película de bons momentos que peca pela superficialidade

Por Felippe Martins

Na minha infância, quando algo repentinamente nefasto parecia que ia me acontecer e, por algum motivo, nos últimos segundos, era poupado das consequências, minha querida avó dizia: “Você tem um anjo da guarda muito bom!”.

Ora, os anjos são, pela cultura cristã, nossos protetores, criaturas celestiais de pura índole e caráter, criados por Deus anteriormente à raça humana e obrigados a nos proteger e nos amar como Ele nos ama.

E é em Legion (2009) que vemos outra face desses seres que podem não ser tão bonzinhos assim.

A história começa com o anjo Miguel (Paul Bettany) literalmente caindo na Terra, cortando suas próprias asas a fim de “virar humano”, invadindo um depósito de armas de fogo, enfrentando a polícia e partindo para um destino incerto enquanto são dadas pistas de que algo como o próprio Armageddon se inicia.

Enquanto isso, em um restaurante no meio do deserto americano, seu dono, Bob Hanson (Dennis Quaid) e o filho Jeep (Lucas Black) dão asilo a uma jovem grávida, a garçonete Charlie (Adrianne Palicki). No restaurante encontramos o cozinheiro Percy (Charles S. Dutton), uma família que teve problemas com seu carro no caminho, os Andersons. Por fim, chega ao restaurante Kyle Williams (Tyresse Gibson), um homem que está enfrentando um divórcio.

Bem, todos reunidos no restaurante, celulares e telefones param de funcionar, a televisão só mostra o famoso sinal de emergência e o clima de que algo terrível parece estar chegando começa a crescer.

Quando a “engraçadinha” vovó Sra. Gadys (Jeanette Miller) chega ao restaurante, realmente o clima, as atuações e a profundidade do roteiro de Legion está satisfatória. Toda a seqüência do primeiro ataque é digna dos filmes de terror de Sam Raimi. E é nesta primeira seqüência que o diretor estreante Scott Stewart mostra o seu potencial. As tomadas de câmera e o tato para o suspense realmente fazem parte do repertório nato do diretor. Os efeitos especiais são ótimos também.

O “sorveteiro”, interpretado pelo eterno dublê Doug Jones está sinistro e o anjo Gabriel (Kevin Durand) mostra sua imponência como o mais fiel seguidor de Deus.

O “pecado” – desculpem o trocadilho – de Legion é realmente o ritmo. É uma pena que isso se perca após a primeira seqüência. Tudo passa muito rápido. As coisas vão acontecendo de forma atropelada, sem a cadência necessária para que o expectador sinta a imersão que uma situação destas requer. Um exemplo de situação semelhante é o filme “O nevoeiro”, de Frank Darabont.

A situação de isolamento dos protagonistas é semelhante ao de Legion. A diferença em “O nevoeiro”, é que cada personagem realmente possui uma razão de existir no roteiro e as situações são cadenciosamente colocadas ao expectador aumentando seu impacto quando algo importante acontece.

Em Legion, Stewart não consegue essa cadência, fazendo com que cada ataque, após a chegada de Miguel (inclusive a explicação do que realmente está acontecendo) se torne algo bem menos intenso do que deveria ser. Não é nem a questão das interpretações, que estão bem acima da média. Dennis Quaid e Paul Bettani levam o filme nas costas e requerer muita coisa de Tyrese Gibson é impossível. O fato é que coisas interessantes acontecem e não nos importamos com isso, pois a maneira com que são apresentadas não é correta.

Mas não é só de males que vive Legion. Apesar da superficialidade com que o roteiro, os personagens e as situações evoluem, temos alguns momentos de mais pura inspiração, que mostram que com um alguns parafusos apertados, Scott Stewart pode realmente nos prover uma grande experiência.

Para começar, o próprio “plot” principal, ou seja, o motivo pelo qual tudo aquilo está acontecendo, é motivo suficiente para qualquer um dar uma conferida. Não é qualquer diretor que tem a coragem numa Hollywood claramente maniqueísta de mostrar velhinhas canibais, crianças com dedos decepados e a humanidade como não-merecedora do amor Divino. Isso até explica o motivo pelo qual Legion não passará pelos cinemas brasileiros, com as distribuidoras entendendo a violência e o plot não convencional como algo comercialmente não viável.

Por fim, a grande questão: Legion é ou não um bom filme?

A resposta: Sim, é um bom filme. Peca pelo ritmo, e pela superficialidade da evolução do roteiro, mas contém algumas seqüências inspiradas, bons atores e idéias fantásticas. Talvez o diretor acerte melhor no seu próximo filme com Paul Bettany, já em gravação: Priest, baseado em um mangá de sucesso.

De qualquer forma, Legion vale mais que uma conferida. Pois como nosso criador, devemos perdoar os defeitos e nos ater às qualidades daqueles que tentam. E por tentar algo diferente, Legion já possui meu perdão.

Felippe Martins é escritor, professor e economista. Além de editor de Cinema do Com Limão e cinéfilo inveterado.

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