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A disparidade de gênero na fotografia: uma entrevista com Danielle Da Silva

A fotografia é, sem dúvida, um meio poderoso para contar histórias. Mas a indústria, como muitas outras, é falha. Durante muito tempo, os homens dominaram esse…

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A fotografia é, sem dúvida, um meio poderoso para contar histórias. Mas a indústria, como muitas outras, é falha. Durante muito tempo, os homens dominaram esse campo, e ainda o fazem. De fotógrafos contratados por grandes empresas de equipamentos fotográficos, fotojornalistas contratados por publicações impressas e digitais, e fotógrafos contratados por empresas, os homens representam a maior porcentagem de profissionais.

É aqui que nossa capacidade de agir como sociedade é vital. O ato de apoiar uma fotógrafa nas mídias sociais pode percorrer um longo caminho. Se continuarmos compartilhando seu trabalho e ouvirmos a discussão sobre representação, nos tornaremos participantes ativos da mudança. A fotógrafa premiada Danielle Da Silva fala sobre a importância de contratar fotógrafas. Fundadora da ONG “Fotógrafos Sem Fronteiras”, Danielle não é uma estranha às lutas que as mulheres enfrentam. Nesta conversa profunda, abordamos a lacuna de gênero na indústria da fotografia, onde ela está enraizada e como podemos mudar a história.

É 2020 e muitos concordam que a desigualdade e o sexismo ainda existem na indústria da fotografia. Você acredita no mesmo?

Eu não acredito, eu sei. Todas as estatísticas apontam para isso. Basta olhar para as embaixadoras pagas/não binárias que representam as principais empresas de câmeras. Veja a porcentagem de fotojornalistas pagas/não binárias. Observe as porcentagens de mulheres em várias agências. Onde quer que você olhe, há uma disparidade.

“Estou no setor há mais de dez anos. Comecei uma organização chamada Fotógrafos Sem Fronteiras. Filmei videoclipes, fui fotógrafa de hip-hop de celebridades e fotografei muitos retratos. Fui o que muitas pessoas chamariam de ‘bem-sucedida’ no setor. Mas ao longo do caminho, fui assediada sexualmente pelos chamados mentores, clientes e colegas fotógrafos. Já me pediram para trabalhar de graça constantemente e me disseram que eu não era boa o suficiente; disseram também que não tenho capacidade para ser a CEO da Photographers Without Borders.”Danielle Da Silva, CEO da Photographers Without Borders

Isso não quer dizer que não estamos diminuindo a diferença de gênero ou que há uma escassez de fotógrafas talentosas e não binárias, prontas para serem contratadas. Existem centenas, senão milhares, de fotógrafas talentosas no mundo, e elas são mais fáceis de encontrar agora do que nunca (portanto, a desculpa mais comum de “não conseguir encontrá-las” ou “elas não existem” está fora de cogitação).

Qual é a origem dessa falta de representação e diversidade?

Este é um problema sistêmico. Temos de abordar o fato de que o patriarcado sistêmico, a supremacia branca, o colonialismo, a capacidade, o racismo e o sexismo foram fundamentais para a indústria da fotografia, em primeiro lugar. E, como resultado disso, temos que reconhecer que o olhar masculino branco cisgênero domina o setor desde o início, antes de entendermos por que a representação e a diversidade ainda são um problema em 2020.

Em todos os lugares existem talentosas fotógrafos femininas e não binárias, prontas para serem contratadas – Crédito: Elizaveta Lavrik/Shutterstock

Quando homens brancos, cisgênero e capazes, dominam uma indústria desde o início, eles criam as regras e instituições em torno dela. Eles criam o conhecimento, a linguagem e um sistema em que todos os que não são brancos, cisgênero e do sexo masculino geralmente não se sentem bem-vindos. Eles criaram dinâmicas de poder que privilegiam e priorizam aqueles que se encaixam no clube masculino.

Muitos fotógrafos masculinos se comportam como estrelas. Geralmente, isso pode significar ambientes tóxicos para as mulheres que estão aprendendo ou apenas tentando prosperar. Conheço muitos casos de agressão sexual e assédio na indústria, dos quais temos que falar na surdina por receio de ter nossas carreiras destruídas.

Então, por um lado, acredito que a falta de diversidade está enraizada nos fundamentos muito problemáticos da indústria da fotografia. Por outro lado, é perpetuada por experiências negativas que as mulheres e o BIPOC (Black, Indigenous, People of Color) enfrentam por tentar se envolver.

Você poderia dar mais detalhes sobre como é o sexismo na indústria fotográfica? E quais problemas as mulheres enfrentam diariamente?

Em termos de sexismo especificamente (e eu acho que é realmente importante reconhecer diretamente o racismo que existe também), histórica e atualmente, tem havido uma grande quantidade de gatekeeper e nepotismo para manter o status quo. Isso significa que, por muito tempo, as mulheres e as pessoas de cor foram ignoradas. E quando você é ignorado, isso se torna mais um obstáculo para alcançar o mesmo patamar dos homens brancos, cisgênero. As pessoas não deveriam ter de superar esses obstáculos ou ter de fazer qualquer coisa para prosperar em uma indústria dominada por homens brancos, cisgênero. Esses espaços geralmente são inseguros.

As manifestações de racismo sistêmico e sexismo em uma indústria são infinitas. Compreendo perfeitamente por que muitas mulheres e pessoas de cor acham isso intimidador e nem querem participar de um jogo que não foi projetado para ser inclusivo e no qual todos os dias parece uma briga.

Por que você acha importante que marcas, publicações digitais e revistas impressas contratem mais fotógrafas?

É importante contratar mais fotógrafas e pessoas de cor. Mas, se vamos desmontar questões sistêmicas e reconstruir uma indústria fotográfica saudável e inclusiva, também é importante que mulheres e artistas do BIPOC tenham um lugar em todos os níveis de uma marca, publicação digital, revista impressa, etc. diversidade e inclusão em todos os níveis, seria óbvio o motivo pelo qual todos precisamos contratar mais fotógrafas não binários e BIPOC.

O mundo não é branco, cisgênero e masculino, e, portanto, o mundo precisa se refletir nos espaços que ocupamos e nas histórias contadas. Histórias sobre mulheres contadas por mulheres fariam mais sentido. Histórias sobre comunidades negras contadas por fotógrafos negros fariam mais sentido. Histórias sobre as comunidades 2SLGBTQ+ [contadas por membros dessas comunidades] fariam mais sentido. Se tivermos dinheiro para contratar pessoas, devemos contratar as pessoas certas para o trabalho.

2SLGBTQ + é um acrônimo usado para se referir a pessoas, como um grupo, que se identificam como sendo de Two-Spirit*, lésbicas, gays, bissexuais, pansexuais, trans, independentes de gênero, Queer e questionamento.

*Two-Spirit é um termo usado por alguns norte-americanos nativos para descrever indivíduos com variantes de gênero em comunidades, especificamente pessoas dentro de comunidades indígenas que são vistas como tendo espíritos masculinos e femininos dentro delas. Aqui no Brasil não usamos muito esse termo.

Como podemos, como indústria e sociedade, melhorar?

Leve a sério as experiências das mulheres e do BIPOC. E então se esforce para ser um aliado, ou até mais – um cúmplice ou co-conspirador. Agir de um ponto de vista sistêmico, não de um ponto de vista reativo. Olhe ao seu redor nos espaços que ocupa – seu local de trabalho, seu bairro, escola, escola, mídia que consome ou livros que lê, seus relacionamentos íntimos.

Se eles são predominantemente brancos, precisamos perguntar honestamente se nossos espaços são seguros para mulheres e BIPOC, para comunidades 2SLGBTQ+ e para pessoas com deficiência. Na maioria das vezes, se formos honestos, começaremos a perceber onde precisamos trabalhar. E sempre há trabalho a ser feito.

Em uma indústria manchada de desigualdade tão quanto recordamos, é preciso um esforço contínuo para mudar as coisas. Requer ações corajosas, perguntas incômodas e abertura às respostas. “Sou uma lutadora, mas não deveria ser. Especialmente se eu sou igualmente ou mais talentosa do que o próximo homem branco”, diz Da Silva. Por um lado, é ótimo que agora haja mais oportunidades para fotógrafas – de empregos à doações e tudo mais. Mas, por outro lado, o fato dessas oportunidades existirem, significa que o problema da desigualdade também existe. E isso é algo em que precisamos trabalhar. A contratação de mais fotógrafas é apenas uma das muitas maneiras.

*Este artigo foi revisado pelo Women @, um Shutterstock ERG (Employee Resource Group) e uma rede profissional que traz os problemas das mulheres no local de trabalho à vanguarda da comunidade Shutterstock para impactar positivamente a cultura da empresa.



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