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Sideload: Liberdade ou uma porta aberta para ataques cibernéticos?
Sideload pode aumentar a liberdade digital, mas a que preço? Descubra os riscos de instalar aplicativos fora das lojas oficiais.
Sideload pode aumentar a liberdade digital, mas a que preço? Descubra os riscos de instalar aplicativos fora das lojas oficiais.
O que você vai descobrir a seguir:
O sideload, que permite a instalação de aplicativos fora das lojas oficiais, tem sido um tema polêmico no mundo da tecnologia. Na União Europeia, a Apple foi obrigada a aceitar o download de aplicativos fora de sua loja digital. No Brasil, a empresa tem enfrentado pressão, após o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) tomar uma decisão baseada em uma queixa apresentada pelo Mercado Livre.
Enquanto alguns argumentam que essa prática amplia a liberdade do usuário, especialistas em segurança alertam para os riscos significativos que ela representa. Em um relatório recente, a Apple detalhou que existem grandes ameaças dessa prática aos consumidores, empresas e desenvolvedores.
A empresa de Cupertino sempre deixou bem explícita sua rigorosa política de avaliação de aplicativos. A instalação via sideload compromete diretamente essa segurança ao permitir a distribuição de softwares sem os mesmos padrões de verificação e controle encontrados nas lojas oficiais.
Para aparelhos Android, que permitem o download de apps foram da loja oficial, descobriu-se que, nos últimos quatro anos, apresentaram de 15 a 47 vezes mais infecções por malware do que os aparelhos iPhone.
A crescente digitalização da vida cotidiana faz com que dispositivos móveis desempenhem um papel essencial na comunicação, no trabalho e no lazer. No entanto, essa dependência também aumenta a exposição a ameaças cibernéticas, tornando a segurança desses dispositivos uma prioridade para usuários e empresas.
Além dos riscos individuais, o sideload também afeta o mercado de aplicativos como um todo. No Brasil, calcula-se que o impacto da App Store é de 275 mil empregos no setor de economia de apps para iOS, registrando um aumento de 56% nos últimos cinco.
Quando falamos em mercado global, os números são ainda mais expressivos, com a App Store movimentando US$ 1,1 trilhão em faturamento e vendas. Deste número, mais de 90% do faturamento e das vendas foram acumuladas exclusivamente para os desenvolvedores, sem comissão paga à Apple.
CryCryptor: Ransomware se passa por um app de rastreamento de contatos e criptografa os arquivos
O ransomware CryCryptor se passa por um app de rastreamento de COVID-19 oficial do órgão governamental Health Canada para convencer as pessoas a instalá-lo por sideload. Depois de instalado, o CryCryptor criptografa os arquivos no aparelho e fornece um endereço de e-mail de contato para pagamento do resgate e a recuperação dos arquivos.
Fontes: Stefanko, Lukas, “New ransomware posing as COVID-19 tracing app targets Canada; ESET offers decryptor,” WeLiveSecurity by ESET, 24/06/2020.
Seals, Tara, “Emerging Ransomware Targets Photos, Videos on Android Devices,” Threatpost, 24/06/2020
COMO FUNCIONA:
O CryCryptor foi desenvolvido a partir do CryDroid, um ransomware de código aberto. Depois de baixado, o CryCryptor solicita permissão para acessar os arquivos no aparelho Android. Então, o malware criptografa tipos comuns de arquivo, como fotos, vídeos e PDFs. Ele anexa uma nota de resgate a cada diretório de arquivos criptografados, com um endereço de email para contato referente ao pagamento do resgate e recuperação dos arquivos.
COMO ELE CHEGA NO APARELHO:
Em junho de 2020, poucos dias depois que o governo canadense anunciou os planos para implementar um app de rastreamento de contatos de COVID-19, os cibercriminosos por trás do CryCryptor criaram dois sites falsos do Health Canada pelos quais ofereciam seu app de ransomware. Aproveitando-se da ansiedade e incerteza das pessoas em relação à pandemia, eles induziam usuários do Android a fazer sideload do CryCryptor usando esses sites fraudulentos.
Ao permitir o download de aplicativos fora das lojas oficiais, desenvolvedores legítimos enfrentam dificuldades adicionais para competir com aplicativos pirateados ou versões modificadas de seus produtos. Isso pode desestimular a inovação e comprometer a sustentabilidade de negócios baseados em aplicativos móveis.
Ao mesmo tempo, consumidores podem ser enganados por apps fraudulentos que se passam por serviços legítimos, levando a perdas financeiras e vazamento de dados sensíveis.
Com esses desafios em mente, é crucial entender os impactos do sideload na segurança digital e no funcionamento do ecossistema móvel. A análise dos riscos envolvidos e das medidas adotadas pelas plataformas para mitigar essas ameaças pode ajudar usuários e empresas a tomarem decisões mais informadas sobre a instalação de aplicativos e a proteção de suas informações pessoais.
Os ataques cibernéticos a dispositivos móveis estão se tornando cada vez mais sofisticados e frequentes. Com o aumento do uso de smartphones para transações financeiras, armazenamento de informações pessoais e trabalho remoto, esses dispositivos tornaram-se alvos preferidos dos criminosos digitais.
A Kaspersky Lab, o maior fornecedor da Europa de serviços de cibersegurança e uma das principais no mundo, relatou que detectaram, só em 2020, cerca de seis milhões de ataques por mês contra dispositivos Android. Já a Agência da União Europeia para a Cibersegurança (ENISA) divulgou que mais de 230 mil novas infecções por malware são registradas diariamente. A principal causa desse alto índice de infecções é a facilidade com que apps maliciosos podem ser distribuídos por meio de lojas de terceiros e downloads diretos, muitas vezes sem qualquer tipo de verificação ou controle.
Outro fator preocupante é a evolução das técnicas utilizadas pelos cibercriminosos. Malwares modernos podem assumir diversas formas, incluindo spyware, adware, ransomware e cavalos de troia bancários.
TIPO DE MALWARE |
Adware |
Ransomware |
Spyware |
Cavalos de Troia |
OBJETIVO | Gerar receita de anúncios ao exibir anúncios excessivos (ou fraudulentos) às pessoas | Extorquir dinheiro de usuários infectados, prometendo, em contrapartida, “liberar” um aparelho sequestrado | Usar dados para atacar usuários Vender dados para hackers Fazer vigilância eletrônica de parceiro (IPS) | Acessar um aparelho para roubar dados bancários e outras credenciais de login de usuário |
IMPACTO PARA O USUÁRIO | Incômodo na forma de anúncios pop-up excessivos Prejudica o desempenho do aparelho | Perda de acesso ao aparelho e a arquivos essenciais Perda de dados Prejuízos financeiros se a pessoa pagar o resgate | Violação à privacidade do usuário IPS: possibilita o abuso e a violência física e mental | Credenciais roubadas (como login do banco, login de contas de redes sociais) Prejuízo por credenciais roubadas (como fraude) |
Observação: A tabela reflete as classificações propostas por empresas de cibersegurança, como Kaspersky Lab, Malwarebytes, WeLiveSecurity by ESET, Norton e Nokia, e órgãos governamentais, como a Agência da União Europeia para a Cibersegurança (ENISA).
Além dos ataques diretos aos usuários, as ameaças também afetam empresas e desenvolvedores. Muitas organizações adotam políticas de “traga seu próprio dispositivo” (BYOD, na sigla em inglês), o que pode levar a infecções em redes corporativas através de dispositivos comprometidos. Isso pode resultar na exposição de dados confidenciais e na instalação de backdoors que permitem a ação de hackers dentro das redes empresariais.
Um único aparelho móvel infectado com malware custa a uma organização uma média de quase US$ 10.000, segundo Ponemon Institute, no estudo “The Economic Risk of Confidential Data on Mobile Devices in the Workplace”, de fevereiro de 2016. Outra curiosidade é que, de 1.800 empresas dos EUA, 46% tinham pelo menos um funcionário que baixou um aplicativo móvel malicioso que ameaçava a rede e os dados da empresa, de acordo com o Mobile Security Report 2021, da Check Point.
Como já comentado acima, a prática do sideload não afeta apenas usuários individuais, mas também tem repercussões no ambiente corporativo e no setor de desenvolvimento de software. Os aplicativos baixados de fontes não oficiais frequentemente não passam pelos mesmos processos de verificação das lojas oficiais, que, no caso da Apple, passa por um batalhão de mais de 500 especialistas dedicados em analisar e buscar malware conhecidos.
Em 2024, a Apple evitou mais de US$ 1,8 bilhão em transações fraudulentas e bloqueou o uso de mais de 3,5 milhões de cartões de crédito roubados.
Se você chegou até aqui, já deve ter entendido o buraco que o sideload representa e entendeu que o modelo é um risco direto para o ecossistema iOS, que historicamente tem se destacado por sua abordagem rigorosa de segurança e privacidade. Mas, afinal, qual a visão da Apple? A empresa argumenta que permitir a instalação de aplicativos fora da App Store resultaria em diversas consequências negativas:
Além disso, usuários que optam por baixar apps apenas da App Store ainda seriam prejudicados, pois poderiam ser forçados a instalar apps externos por razões de trabalho ou interações sociais. Isso comprometeria a segurança de todo o ecossistema.
O sideload apresenta riscos significativos para a segurança e privacidade dos usuários. Embora ofereça maior liberdade na escolha de aplicativos, também expõe dispositivos a uma ampla gama de ameaças. A abordagem da Apple, baseada na verificação rigorosa dos apps na App Store, tem se mostrado eficaz na proteção dos usuários há quase 20 anos, minimizando a presença de malwares e fraudes dentro do ecossistema iOS.
Estudos indicam que ecossistemas fechados, como o da Apple, reduzem significativamente o número de ataques cibernéticos em comparação a sistemas mais abertos. Em 2023, um relatório de segurança mostrou que apenas 0,1% dos ataques a dispositivos móveis foram direcionados a usuários do iOS, enquanto o Android representou mais de 70% das ameaças identificadas. Isso se deve, em grande parte, ao modelo de distribuição da App Store, que exige um rigoroso processo de revisão antes de permitir a publicação de um aplicativo.
Como bom fã de George Romero, comparo este cenário com um apocalipse zumbi, daqueles representados pelo diretor nova-iorquino nas telas de Hollywood, onde os malware são os cadáveres reanimados, o ecossistema fechado do iOS é uma cidade murada e os sobreviventes são os consumidores. Você pode até querer uma certa liberdade, mas trocaria o conforto e a segurança de uma cidade murada, pelo risco das ameaças de um ambiente inóspito? Tem gente que até deseja se aventurar, mas se você não for um especialista, será uma presa fácil — seja para o morto-vivo ou para aquele malware maroto.
Diante desses fatores, a proibição do sideload no iOS se justifica como uma medida essencial para a proteção do ecossistema e da experiência do usuário. Assim, é fundamental que consumidores e empresas compreendam os perigos dessa prática antes de optar por instalar aplicativos de fontes desconhecidas. A segurança digital deve ser uma prioridade, e a App Store continua sendo um modelo eficaz para garantir essa proteção.